#Resenha 🤗
Um livro de fantasmas, que formam um mundo de vozes sussurrando ao nosso ouvido, aqui, o leitor tem papel fundamental na experiência e montagem do quadro dessa história. Pedro Páramo é uma novela que foi pensada e escrita com o intuito de não ser fácil, uma história quase infinita, inesgotável fonte de descobertas, logo, somos convidados não apenas a ler esse livro, mas a reler, reler, reler…
Com sua narrativa caminhando intrinsecamente entre a tragédia e a poesia, Juan Rulfo conquistou relevância mundial, ultrapassando as fronteiras do México usando a oralidade como recurso de escrita, criando um paradoxo entre a forte regionalidade e universalidade alcançada.
É inexplicável a sensação de leitura. Lemos uma história que seria impossível de ser narrada. Como o tempo passado e o que ainda está por vir poderiam ser contados tão intimamente, em um cruzamento de vidas, falas e experiências? Rulfo responde com sua concisão incomparável dando voz a fantasmas, que vagam pela quente e sufocante Comala, relatando casos de amor, ciúmes, perda da religiosidade e relações sociais de poder.
Um filho busca o seu pai, após a morte da mãe. As relações familiares e interfamiliares prosperam a partir das entrelinhas, com pessoas atuando de maneiras irracionais numa realidade imaginada, mas jamais falsa, em que ninguém é perdoado, nem mesmo o leitor. Sentimos uma amostra da dor universal que o ser humano carrega, seja no México ou em qualquer outro lugar do mundo. .
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Não é à toa que Pedro Páramo foi considerado um dos melhores livros do século XX, o próprio Rulfo afirma que aprendeu a viver com a solidão, e cristalizou isso em suas palavras, perfeitamente trabalhadas para nos entregar um livro impressionante, nada menos que isso. .
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. ⭐Avaliação: 5/5
Citação: “Fazia tantos anos que não erguia o rosto, que me esqueci do céu. E mesmo que eu tivesse erguido, o que haveria de ganhar? O Céu está tão alto, e meu olhos tão sem olhar, que vivia contente só de saber onde ficava a terra”. . .
. 📌Informações técnicas:
Livro: Pedro Páramo
Ano: 1955 | Edição: 2017
Páginas: 140
Editora: BestBolso
Gênero: Romance
Autor: Juan Rulfo
Tradução: Eric Nepomuceno
#resenha ❗
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Livro: O Reino deste mundo
Ano: 1949 | Edição: 2009
Páginas: 132
Editora: Martins Fontes
Gênero: Realismo mágico
Autor: Alejo Carpentier
Tradutor: Marcelo Tápia
O “Novo Mundo” foi alcançado logo após a conquista da independência haitiana. Os brancos deixaram de governar e o primeiro monarca negro da nação foi coroado. Carpentier, autor cubano, explorando o tempo que precedeu essa revolução, constrói uma história inaugural do real maravilhoso ou realismo mágico, como é conhecido atualmente.
Em meio à revolta dos negros e ao marcante retrato social do Haiti na época, há o escravizado Ti Noel e, sob sua vivência, acompanhamos as amargas lutas travadas em busca de liberdade. O realismo mágico surge com o histórico escravizado Mackandal, uma figura real e importante para a luta da independência no Haiti. Na narrativa, visto como lendário, Mackandal foi perseguido pelos colonos franceses e, para escapar, utilizava artifícios fantásticos, transformando-se em animais e outros seres da natureza.
Além disso, percebe-se que narrador não demoniza as religiões, mas dedica um novo olhar para essa parte da realidade que ajudou a alimentar o desejo transformador social e político. Ao passo que os colonos brancos franceses perderam o poder, um monarca negro assume o trono e passa a governar o país independente, mas seu reinado é marcado pela crueldade, com a imposição do trabalho escravo para brancos e negros. Nisso, vê-se o quanto a busca pelo poder desumaniza o ser humano, e isso o destrói, restando-lhe apenas a completa essência de natureza terrena, aceita somente aqui.
Em alguns momentos, senti a leitura arrastar, resultado de uma linguagem rebuscada utilizada pelo narrador, desacelerando a trama. Porém, deixar-se navegar pelo fantástico de Carpentier é um ato de passagem, que nos leva pelos caminhos da apaixonante América Latina, a perfeita crônica do real maravilhoso.
Avaliação: 4/5
Citação: “A grandeza do homem está precisamente em querer melhorar o que ele é. Por isso, esgotado pelas penas e pelas tarefas, belo dentro de sua miséria, capaz de amar em meio às pragas, o homem só pode encontrar sua grandeza, sua máxima medida, no Reino deste Mundo”.
Hoje não é resenha de livro, mas um registro de um lindo encontro.
Foi um prazer participar, pela primeira vez, do @leiamulheresteresina
Uma tarde maravilhosa com pessoas incríveis.
Falar de literatura é sempre revigorante, renovador.
Conversamos e trocamos ideias sobre as obras: "Sejamos todos feministas" e "Para educar crianças feministas", da autora Chimamanda Ngozi Adichie.
O grupo é aberto para mulheres e homens de todas as idades.
Vamos nos engajar cada vez mais. 🤩
Livro: Vidas Secas
Ano: 1938 | Edição: 2018
Páginas: 320
Editora: @grupoeditorialrecord
Gênero: Romance
Autor: Graciliano Ramos
A busca pela alma de uma cachorra em meio à dureza da terra rachada, a fome desoladora que fazia sumir as carnes do corpo, a lama que encobria os garotos para esconder, mesmo que por um curto momento, as mazelas da vida. Vida parada, que não evolui, que não vai nem volta, não reconhece o porvir. Os retirantes querem se debandar, observam a vida ao redor, desejam algo além. Fome de vida, sede de avanço e a busca irremediável da voraz natureza humana.
Vidas Secas está presente no imaginário brasileiro, e quem não leu pelo menos já ouviu falar. Escrita em 1937, a obra de Graciliano Ramos nunca se torna ultrapassada.
O narrador nos guia pelos sonhos de Fabiano, marido de Sinhá Vitória e pai de dois meninos. Eles partiram para fugir da seca do Nordeste em busca de vida melhor. Queriam ser livres das amarras quase inquebráveis da miséria. Queriam fartura até mesmo para a cachorra Baleia, tão sonhadora de um dia ter a barriga cheia de preás. .
Mas nem com as palavras a família tinha intimidade. A angústia dos quatro, diante de um mundo de coisas para eles inomináveis, passa a ser nossa. Fabiano sentia-se animal por não saber de muita coisa, mas mostra toda sua racionalidade e empatia quando se recusa a cometer um ato cruel e quando reflete sobre o resultado de suas ações. Ele se preocupa sobre como os filhos o verão, como sua mulher o vê e, principalmente, como sua consciência o permite enxergar. .
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A humanização é vista desde a ótica da dimensão da esperança. Quanto mais esperança as personagens se permitem ter, mais humanas se tornam e, consequentemente, mais próximas de nossas realidades elas chegam. Mesmo inseridas em um contexto social limitador, sonham com a vastidão, aumentando, a cada passo, os sonhos de evolução, a vontade de crescer e conhecer um mundo além daquele todo coberto de penas.
Nota: 5/5 .
.“Baleia queria dormir. Acordaria feliz num mundo cheiro de preás. E lamberia as mãos de Fabiano, um Fabiano enorme. As crianças se espojariam com ela, rolariam com ela num pátio enorme, num chiqueiro enorme. O mundo ficaria todo ch
#Resenha ⤵️ .
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Livro: Cem sonetos de amor
Ano: 1959
Páginas: 124
Editora: L&PM
Gênero: Poesia
Autor: Pablo Neruda
Tradução: Carlos Nejar
Quando penso em Neruda, o romantismo e o encanto pelo cotidiano me vêm à cabeça. Desde adolescente, quando tive o primeiro contato com o autor, me encantei pela maneira simples, mas totalmente apaixonada, com a qual ele descrevia a vida e seus amores.
Em “Cem sonetos de amor”, livro dedicado para sua mulher Matilde Urrutia, Neruda escreve sobre a manhã, o meio-dia, a tarde e a noite, detalhando uma paixão tão intensa, tão verdadeira que finalizei a leitura com vontade de ser Matilde, por um dia ou por uma vida inteira.
Poeta da América Latina, nascido no Chile, ganhou notoriedade – e voz- no mundo inteiro. Neruda acreditava e defendia que a poesia deveria ser lida por todos. Escrevia sobre assuntos transcendentais de uma maneira livre e intimista, quase exclusiva, por isso, desperta em seus leitores a conexão intrínseca com a vida, a morte e o amor, expressados com clareza e profundidade, tornando impossível não ter vontade de ler e reler todos os seus versos.
A cada estrofe lida dos Cem sonetos de amor, sentimos a fascinação do poeta por todas as coisas da vida, quando descreve a ligação de Matilde com a terra, nos ligamos a ela, quando diz “tu és pão de cada dia para minha alma” ou ainda “eu te amo para começar a amar-te” sentimos o calor de cada palavra.
Neruda tinha uma maneira incansável, ao mesmo tempo leve e intensa, de exprimir o universal, fazendo-nos crer, realmente, que todos merecemos doses de poesia em nosso dia a dia. Porém, sua poesia não se limitava ao romântico. Após ser preso, perseguido por questões políticas e por lutar contra o fascismo, vemos a importância social imbuída em cada texto, além de todo o esforço para que pudéssemos entender a poesia de uma maneira diferente e, assim, começar a nos compreender.
Trecho: "Meu amor tem duas vidas para amar-te.
Por isso te amo quando não te amo
E por isso te amo quando te amo." .
Nota: 5/5 ⭐
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. 📖 No blog tem o post completo e os sonetos que mais gostei.
Vai no perfil e clica no link.
Primeira leitura de 2019 concluída. 🤩
Com isso, aproveito para fazer um convite: Vamos ler mais esse ano?
Não importa se for um livro, dois ou 10. Gostaria de propor esse desafio do bem, para que você leia mais e leia da nossa literatura. Esse ano, o perfil será dedicado inteiramente para leituras de escritores brasileiros e demais países da América Latina. .
Ao longo do ano poderão até surgir um livro ou outro que não sejam parte do projeto inicial, mas o foco não será perdido. .
Somos o maior país da América Latina e, mesmo assim, nos encontramos cada vez mais distantes dessa cultura continental, cada vez menos latinos. Consumimos tudo o que nos empurram de fora, valorizamos mais o que não nos pertence e terminamos esquecendo da riqueza que temos em nossos quintais.
Começaremos a mudar esse cenário. .
Para ajudar, fiz uma lista com 12 livros para ler ao longo desse ano. O post está no blog Nossa Literatura, você pode clicar pelo link do perfil. .
Você tem alguma sugestão de livros para lermos esse ano? Comenta aí, vou amar aumentar minha lista infinita de leituras haha 😊 🦋
#DesafioNossaLiteratura
Livro: A Hora da Estrela
Autora: Clarice Lispector
Ano: 1977
Páginas: 88
Editora: Rocco
Gênero: Romance
No universo de Clarice, em que nada é por acaso e tudo termina sendo o acaso, somos apresentados a Macabea, a pálida e manchada nordestina que, após perder os pais, passa a viver com a tia autoritária. As duas vivem, por um período, em Alagoas, mas logo se vão para o Rio de Janeiro. Lá, a tia morre e Macabea se vê sozinha, da mesma forma como chegou ao mundo e este começou a devorá-la.
Ela respondia vivendo. Apesar de não fazer conta de sua existência.
Jamais se perguntou: “quem sou eu?”, não se atrevia ou mesmo não sabia que podia se perguntar tal coisa. Sem forças, quase sumindo, trabalhava como datilógrafa, apesar de não ser muito íntima das palavras.
Rodrigo SM é o narrador que nos apresenta Macabea, contando sua história. No livro, vemos que ele tem consciência que faz parte daquela ficção. A metalinguagem desenvolvida por Clarice Lispector nos conecta com a obra, que pode ser lida como uma denúncia, um romance, uma resposta ou um adeus.
O narrador jamais viveu o que vive Macabea, mas é empático, tenta nos confortar, mesmo munido de uma história desconfortável, com ânsias desesperadas. Frequentemente, pede um tempo a nós, leitores, para poder respirar, viver, morrer e experimentar a ressurreição. O pedido era para ele ou para Macabea? Ele cria uma vida, cria um ser invisível, tinha que cuidar dela.
O livro tem proporções universais. A miséria de Macabea não é o primeiro plano, mas permanece ali, zunindo sem parar. Sem nenhuma perspectiva de vida e de futuro, a moça ganha o leitor que, depois de algumas páginas, se vê torcendo e tentando arrumar o mundo para que lhe sirva.
Macabea sorria, mas o mundo não a via. Ela, que prestava atenção até no capim que crescia entre as pedras da rua, jamais teve nenhuma atenção voltada para si. Sem conhecer outro caminho, nasceu e viveu miserável.
Nota: 5/5
Trecho: “Todos nós somos um e quem não tem pobreza de dinheiro tem pobreza de espírito ou saudade por lhe faltar coisa mais preciosa que ouro – existe a quem falte o delicado essencial.”
[...] “Porque há o direito ao grito. Então eu grito.”
Livro: Jane Eyre
Autora: Charlotte Brontë
Ano: 1847 | Edição no Brasil: 2018
Páginas: 536
Editora: Zahar
Gênero: Romance
Tradução: Adriana Lisboa
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Em seu mais famoso livro, a mais velha das irmãs Brontë, Charlotte, escreveu um romance de formação com nuances góticas e vitorianas. A trama segue atual, sem deixar uma rota de fuga, dando-nos apenas a opção de apreciar cada detalhe de Jane Eyre. O clima de constante indignação durante toda a obra é a essência de Charlotte, que expõe questões de religiosidade, classes sociais e sexualidade, principalmente no cerne do espaço da mulher em sociedade. .
Jane Eyre, uma criança órfã, desde que nasceu percorreu o caminho mais laborioso da vida, sofreu na casa da tia, onde viveu na infância e, ao ser mandada para a escola de Lowood, sofreu humilhações e dolorosas perdas. Após anos, conseguiu se tornar professora, saiu em busca de emprego e foi escolhida para ocupar o cargo de governanta em Thornfield Hall, a enorme propriedade de Mr. Rochester, seu patrão e, indubitavelmente, seu amor. .
Sagaz, decidida e totalmente a frente do seu tempo, Jane Eyre foi uma personagem que abriu portas de inspiração para o debate da liberdade feminina na literatura e, consequentemente, na sociedade. Mesmo sendo cristã com valores tradicionais, ela se impôs contra a sociedade patriarcal, correu riscos, mas lutou para jamais perder a sua liberdade e, principalmente, a tranquilidade com a própria consciência. .
Jane é, ao mesmo tempo, a representação da mulher que caminha se desvencilhando, aos trôpegos, das amarras sociais e limitadoras, e da mulher com um atrativo indomável, quase selvagem, da beleza pura do ser feminino. O mundo a quer puxar para baixo, mas Jane luta, e nos contempla quando mostra sua força, que a faz lutar pelo direito de amar e pelo direito de viver em plenitude. Sem exigir nada a mais, mas, igualmente, sem nada a menos do que lutou para merecer. .
Nota: 5/5 .
Trecho: “Os preconceitos, todos sabem, são mais difíceis de erradicar do coração cujo solo nunca foi resolvido nem fecundado pela educação. Eles se enraízam ali, firmes como ervas daninhas no meio das pedras”.
Livro: A Amiga Genial
Autora: Elena Ferrante
Ano: 2011 | Edição no Brasil: 2015
Páginas: 336
Editora: Biblioteca azul
Gênero: Romance
Tradução: Maurício Santana Dias
O primeiro romance da tetralogia napolitana narra a amizade de duas mulheres, Elena Greco (Lenú) e Rafaella Cerullo (Lila) na infância e adolescência. A narração é iniciada em meados da década de 1950. A Itália pós-guerra, a dominância da máfia, o machismo e a pobreza, formam o plano de fundo tecido magistralmente pela escritora.
Lenú começa a contar a história após receber um telefonema de Rino, filho de Lila, preocupado com o desaparecimento da mãe. Ela havia cumprido a promessa de sumir, não morrer, mas desintegrar-se, Lila já não existe e fez questão de apagar o seu passado para que ninguém jamais pudesse encontrá-la.
Nesse contexto, Lenu, já com mais de 60 anos, vai contra o desejo da amiga e resolve eternizá-la. Voltando ao âmago de suas primeiras memórias inicia sua narrativa com a intenção de reviver Lila. A amiga genial é um livro que divide opiniões, mas que une no cerne da escrita de Ferrante, suas palavras nos despertam diferentes emoções ao vermos a relação conflituosa das amigas.
Ao contrário da ausência da identidade da escritora, suas personagens são quase palpáveis, a construção detalhada e tão bem trabalhada nos deixa a sensação de que Lenu, Lila e todos os outros realmente existem. Por essa e outras tantas características me senti ligada emocionalmente ao livro, senti raiva, emoção, tensão, ansiedade. As palavras da escritora nos guiam por um caminho sem volta, a conexão com a história, que saltam um degrau além da ficção.
O conselho mais direto que posso dar sobre Ferrante é que você se deleite com suas palavras, já que apenas falar de seus textos seria como tentar domar a grandiosidade existente, precisamos ler Elena Ferrante, mais do que entender, precisamos sentir para sermos capazes de não reduzi-la.
Nota: 5
Trecho: “Logo precisei admitir que as coisas que eu fazia sozinha não eram capazes de disparar meu coração, só aquilo que Lila tocava se tornava importante. Se ela se distanciava, se sua voz se afastava das coisas, estas se cobriam de manchas, de poeira".